domingo, agosto 01, 2010

Ficção virtual


Na semana passada a revista TIME deu destaque ao site wikileaks. Na VEJA dessa semana o site volta à evidência. O que a matéria da revista brasileira pode acrescentar a tudo que já foi dito pela mídia internacional?

O titulo da matéria da VEJA:“A aliança entre a ‘velha’ e a ‘nova’ imprensa no vazamento dos documentos sobre a Guerra de Afeganistão” é direto e objetivo, nos induzindo a imaginar uma “aliança” não aventada na matéria da revista TIME ou parceiros do empreendimento.

A matéria do TIME aponta em outra direção. Segundo a publicação americana o “Wikileaks "poderia tornar-se uma ferramenta jornalística importante, como o Freedom of Information”

Ora, se tornar uma ferramenta jornalística importante pressupõem certa autonomia em relação ao “velho” sistema de comunicação empresarial.Todavia, quando a VEJA anuncia uma “aliança” entre o “velho”(grande imprensa) e o “novo”(comunicação virtual) a perspectiva se altera substancialmente.

Afora as bobagens de estilo VEJA :-”a cabeleira prateada de seu criador e porta-voz, o australiano Julian Assange, de 39 anos”- concordo com a abordagem “aliança” suscitada por Jadyr Pavão,autor da matéria.

Isso porque é difícil imaginar um poder extremo do site Wikileaks capaz de envolver jornais consagrados a fim de dar credibilidade e difusão aos documentos obtidos por hackers.

Será que o “estimulo” para fuçar documentos secretos específicos não foram gestados na mesa dos editores das grandes empresas de comunicação? Qualquer joguinho de estratégia prevê as trilhas a serem seguidas. Não só Assange adora xadrez e tem enorme desenvoltura no ambiente virtual para, desde o último domingo, disponibilizar nos monitores linkados à internet no mundo inteiro, 92.201 documentos secretos dos Estados Unidos relativos à Guerra do Afeganistão. Não se trata de filminhos de combate tão acessados no Youtube, trata-se de relatórios de inteligência, planos de operações, descrições de ataques inimigos, relatos de encontros com políticos locais - ocorridos entre janeiro de 2004 e dezembro de 2009.

Nesse episodio o site WikiLeaks.org cintilou na blogosfera e ascendeu na Terra.

Curioso é que os veículos da grande imprensa pareciam não saber de nada até o aparecimento da montanha de infos disponibilizadas pelo site de Assange.

Há quem acredite!

Ou, será que desejam que acreditemos que os logos dos grandes veículos de imprensa (velha) não participaram da jogada? A “velha” imprensa está em crise, por que perderiam uma oportunidade tão preciosa de resgatar espaço através de um “furo” tão grave quanto Watergate, fuçado e desvendado pelo Washington Post.

Os jornais não possuem mais “fontes” de vanguarda? Ou será que ninguém no NYT entende de realidade virtual?

Essa pergunta nos leva a percorrer corredores com mais portas que a sede da Matrix.

Na seqüência da matéria a VEJA coloca alguns dados que vale a pena conferir...”Desde 2006, o WikiLeaks, uma organização aparentemente independente, sem sede e tocada por voluntários, se dedica a vazar documentos com informações estratégicas, sigilosas e inconvenientes ligadas a governos ou corporações, sob o argumento de “reduzir a corrupção, aprimorar administrações e fortalecer democracias”. Divulgar os documentos militares foi, mais uma vez, como cumprir uma velha promessa da internet: ofertar na rede informações sem as restrições (de espaço, interesses editoriais e econômicos) que atingiriam a imprensa tradicional e, a partir daí, transferir à comunidade virtual o poder de analisar tudo. Os leitores poderiam até eleger os registros de guerra mais populares, a exemplo das listas de favoritos que sobram na web. Mas nem tudo são rankings de vídeos mais assistidos no YouTube. E os velhos jornais e revistas prestaram um grande serviço no episódio deste vazamento.
No mesmo dia em que o WikiLeaks subiu ao ar os mais de 90.000 documentos em estado bruto, o jornal americano The New York Times e o britânico Guardian, além da revista alemã Der Spiegel, publicaram edições especiais recheadas de análises do material vazado. Assange lhes havia franqueado os dados com um mês de antecedência.”

Quer dizer,os únicos pegos de surpresa foram os internautas e alguns membros da administração publica?

Que compromisso é esse?

Você brinca de difundir algo inédito simulando o “compromisso de transferir à comunidade virtual o poder de analisar tudo” para pouco depois revelar as articulações que possibilitaram essa manobra.

O fato é que o que vimos na internet já tinha sido lido e analisado - quem sabe, editado e selecionado - pelos grandes órgãos da imprensa internacional. Desconfiar de tudo,sobretudo,dos interesses que serão agraciados com a revelação dos documentos secretos é uma atitude saudavel.

Jadyr resume esse continho de ficção libertaria de forma irretocável : Unir-se aos “senhores” do jornalismo, tantas vezes criticados por Assange, foi uma estratégia calculada pelo WikiLeaks. O jornalista Nick Davies, do Guardian, revelou como a “velha” e a “nova” imprensa trabalharam juntas no caso. Um representante do jornal se encontrou com o chefão do WikiLeaks em um café em Bruxelas, na Bélgica, pouco mais de um mês antes da data do “grande vazamento”. Assange revelou o que tinha em mãos e também seu principal temor: que, ao jogar os dados na rede, eles simplesmente se perdessem, indiferenciados, no turbilhão de bytes publicados diariamente...as antiquadas organizações de mídia ainda têm algo a oferecer”, diz Kennedy.

Parece que Assange entendeu isso.