segunda-feira, julho 24, 2006

Fronteiras Imaginarias

http://pt.wikipedia.org/wiki/Complexo_do_Alemão / Berlim
Os dois séculos passados foram marcados pela contribuição do gênio alemão nos mais vastos domínios do saber.A genialidade impar dos seus pensadores ampliou e aprofundou os significados da razão, da estética, da ética, da lógica, das artes e das ciências.Uma forte determinação e um fluxo original de idéias consagrou escolas e solitários pensadores. F. Nietzsche, para não estender por muitos exemplos. Esse pensador,durante toda sua vida confrontou os cultos ao establishment de sua época.Contra tudo e contra todos sua obra se constituiu, como uma das mais extraordinárias contribuições para o pensamento das sociedades do século XX.Um respeitável numero de escritores, músicos, pintores, a notável arquitetura e o talento especial para concepção técnica de máquinas e equipamentos refletem a complexidade de uma imponente sociedade moderna.Contudo, nem mesmo a poderosa tradição cultural e os aparatos intelectuais e morais de que dispunham conseguiram deter o avassalador crescimento de uma liderança populista messiânica que fortalecida pela paixão, conduziu as massas à intolerância, ao terror e a violência.Mesmo a extraordinária historia de lutas entre povos, que outrora integravam o Império Romano e que se consolidou mais tarde na nação alemã, foram impotentes diante do poder avassalador e destrutivo da segregação e do ódio.Apesar dos desatinos que conhecemos,antes mesmo do inicio do século XX, os alemães ja exerciam influencia política em alguns paises latinos americanos.No México por exemplo, treinaram e equiparam o exercito nacional para enfrentarem as forças Zapatistas e conter o poder expansionista do poderoso vizinho do norte.Se resultado de suas armas e estratégias, ou não, o fato é que Zapata jamais chegou ao poder, porém, lamentavelmente, os mexicanos que se tornaram soldados ao estilo germânico perderam suas vidas sem impedir a tomada de suas terras pelos ianques.Com o score de 1x1 os conselheiros militares alemães voltaram para casa. Nos dias atuais as divisões de força são bem diferentes. Recentemente uma revista internacional de política externa publicou um ensaio do ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda no qual nos apresenta uma curiosa analise sobre as novas tendências da esquerda na América Latina.A leitura me suscitou paralelos com desenhos de fronteiras imaginarias, bem ao estilo do realismo fantástico latino americano, cabíveis no jargão que hoje identifica a luta entre as forças do bem contra as do mal.Para quem desconhece ensaio,colo aqui um breve resumo: dentro de uma lógica (não germânica) o ensaísta nos propõe a diferença crucial entre os lideres latinos de esquerda, hoje no poder.Nesse panorama, Castañeda coloca o presidente brasileiro Lula e a presidente chilena Bachelet como os representantes da banda do bem ficando para os presidentes Morales da Bolívia, Chaves da Venezuela e Khirchner da Argentina a banda do mal.
Diante da inovação pergunto: porque tantos duvidam da liderança espontânea do presidente Bush sobre a política das Américas? Digo espontânea pelo fato de que o presidente norte americano não precisou de armas para convencer alguns intelectuais latinos de que a guerra do bem contra o mal é uma realidade e não um artifício hipócrita e mentiroso para justificar a invasão do Iraque.
Comecei de fato a me preocupar com o efeito Castañeda quando li os artigos de alguns cientistas políticos nacionais avaliando positivamente o populismo latino do bem.A principio pensei tratar-se apenas de mais um artifício eleitoreiro.O velho e persistente oportunismo.Afinal,os pensadores "partidários" necessitam de substancia teórica para justificarem as praticas assistencialistas do governo a fim de fortalecerem a campanha de Lula nos setores sociais mais preparados, visando o grosso dos votos das regiões urbanas.Esse é um ponto sensível e crucial na eleição que se aproxima.Nesses dias de violência muitas pessoas aceitam as praticas assistencialistas,mesmo sabendo de suas graves conseqüências para a vida política nacional.Partem da lógica de que o mediocre crescimento econômico não consegue atender as necessidades preementes por empregos e associam os crescentes bolsões de miséria que invadem as ruas dos grandes centros urbanos, com focos potenciais de crime e violência.
Seguindo a tradição os personagens do circo político nacional permanecem se lixando para as conseqüências das tais praticas populistas e iniciaram a pregação de idéias inspiradas em lendas políticas carismáticas que dedicam toda uma vida a causas em prol do povo sofrido.Os mais delirantes propõem a redefinição de uma nova estética para o tradicional culto a personalidade e o restabelecimento da crença popular da - "mão caridosa" - porque aparentemente democrática, dos governos populistas do bem.Trata-se de mais um movimento renovador da tradicional e abundante mediocridade continental.
Nesse quadro bizonho proliferam os fungos e o cheiro de bolor tornou o ambiente irrespirável. Os mais tímidos se sentem pouco à vontade quando justificam sua adesão ao governo através do aforismo de que a corrupção escachada que presenciamos é um fenômeno natural, um processo indissociável da cultura política latina americana.Dedicados que são devem estar gestando uma teoria para encaixar a corrupção do bem em oposição à do mal.Os mais discretos partidários do governo já  alegam há algum tempo que a corrupção é um mal endêmico, como a malaria, abundante nos trópicos, e com a qual teremos que nos habituar a conviver. Sobre a alegação de que aqui sempre houve corrupção, não se inventou nada, o ministro da cultura Gilberto Gil assim definiu para um jornal carioca as malfadadas ações dos membros do governo e diretores do PT, suspeitos de corrupção, próximos ao presidente da republica .
O ministro Gil é um músico reconhecido e tem um nome a zelar.A sua opinião,sempre clara,objetiva e precisa teve a força de um raio sobre minha consciência.De maneira tranquila,pausada e segura o ministro me transmitiu a fisicalidade de uma muralha ao volátil conceito de imponderabilidade.
Mais grave contudo são os elementos desprovidos de caráter.Eles olham mais longe quando afirmam que a insignificância econômica da corrupção justifica o desinteresse em se investigar e punir.Arrogantes exibem uma tabela para mostrar que os desvios financeiros da corrupção são inexpressivos se comparados ao volume dos benefícios sociais que o governo vem transferindo para os pobres através das bolsas contra a fome.
Também não deve ser tratada com desdém a argumentação dos grupos ligados a mais importante frente de luta do PT que é a reeleição do presidente Lula.No foco dessa luta encontramos o núcleo paz e amor e sua lógica de difícil assimilação.Como eles não demonstram nenhum pudor em revela-la acredito que ela será o tema central e slogans de campanha.Ela parte do principio de que nenhum crime ficou patente e ninguém conseguiu provar o envolvimento de parlamentares e membros do governo com a corrupção.Segundo essa lógica inexiste, portanto, corrupção do bem no governo do populismo do bem.As CPIs confirmam essa assertiva e por isso se tornaram programas cômicos de grande sucesso popular.
Costumamos não dar atenção quando pessoas irresponsáveis falam bobagens.Aí reside o perigo. Começamos a nos preocupar quando intelectuais sérios se metem em aventuras irresponsáveis.Talvez porque então as coisas ja desandaram demais .Não desprezo o fato de que alguns cientistas políticos honestos sejam simpatizantes do governo.As pessoas costumam admirar o mundo que inventam.O que me preocupa é quando eles começam a se manifestar publicamente de forma irresponsável.Recentemente, entusiasmado pelas idéias de Castañeda ou não, o cientista político Luiz de Fiori anunciou que estamos vivendo uma nova onda nacionalista mundial.Ele entende que as renegociações por “preços justos” com as petroleiras são reflexos de uma nova atitude politica. Dentre outras explicações sugere que estamos diante de um revival nacionalista mundial.Fiquei surpreso com a ideia.Num texto ambíguo sobre questões energéticas o ilustre cientista político afirma que somente a idiotia conservadora considera como populismo latino americano o que é um reflexo coerente dos governos da região sintonizados com uma nova onda nacionalista mundial.
Em seu artigo ele alude a ocorrências dispersas, identificadas pelo New York Times como a ressurgência mundial das políticas nacionalistas.O diário nova-iorquino serve pra tudo.
Nesse caso serviu para credenciar na mídia local a lógica do autor.Seus argumentos sobre as atitudes dos novos governos da região interagindo com uma vanguarda politica mundial me pareceu absurda e ingênua para servir como fundamento de um novo nacionalismo em oposição à economia global e a cultura mundialista.Para os prepotentes é sempre bom lembrar que a idiotia conservadora,dementes e mentecaptos também foram vitimas de um projeto nacionalista absurdo que banhou a Alemanha de sangue. Sabemos desde criancinhas que as discussões sobre reservas minerais, insumos energéticos e preços são, na maioria das vezes, batalhas travadas sobre o fio da navalha, ou melhor, das baionetas.Nem por isso desfralda-se por ai bandeiras de novos nacionalismos.Será que de Fiori tem duvidas sobre o conteúdo e a nobreza de princípios que defende a eternização do populismo do bem nos bucolicos recantos latino americanos?
Adriano DE AQUINO
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