Festeja-se as cifras alcançadas pelo mercado de arte.
Aplausos!
O mercado é o nicho final no intercâmbio entre produtos e dinheiro.
Enquanto o mercado apresentar números atraentes a perspectiva de retorno ao método
arcaico do escambo permanece longe do horizonte das trocas sociais.
Ainda que meu saldo pessoal não melhore como reflexo
indireto dos altos preços divulgados por uma operação do mercado de arte, não faço
considerações morais sobre o preço de uma obra de arte.
Parto da premissa de que o preço, em si, não é uma questão
da arte. Sequer uma confirmação do valor cultural e artístico de uma obra de
arte. O valor de uma obra de arte não é concedido simultaneamente ao
certificado de venda. O alto preço alcançado por uma obra de arte fala
sobretudo do poder afirmativo do dinheiro pago na transação. A comunicação e a mídia
adoram fatos espetaculares. Por isso, os preços das obras de arte da atualidade
se tornaram fenômenos mais ‘espetaculares’ que as próprias obras. Por essas e outras,
os produtos que alcançam patamares altos se encaixam na vitrine mais visitada
da mídia. Entretanto, subestimar, desferir imprecações contra os preços altos
demais de um artista que o indignado despreza é o mesmo que ficar decepcionado
com os preços baixos demais de um artista que o mesmo ‘amante’ de arte admira. O
mercado é absolutamente indiferente a esses detalhes de natureza subjetiva.
Com a crise, o emocional se agiganta e aparece ‘neguin’ dizendo
que não daria 1 vintém por uma obra vendida por milhões. Dessa forma, um episódio financeiramente
positivo do mercado fomenta a cizânia num ambiente cultural empobrecido pela dinâmica
do dinheiro e pela falta dele.
Tanto assim que os que se opõem ao esplendoroso fato de uma
venda milionária, promovem um julgamento estético e moral do artista bem-sucedido.
Tudo inútil, dado que a questão é de natureza mercadológica. Isso quer dizer
que tanto pode ser uma ação puramente especulativa quanto representativa do
gosto do comprador que tendo dinheiro em abundancia, realizou um sonho de
consumo comprando um objeto de arte com o qual pretende conviver por um longo
tempo.
Na escala macroeconômica - industrias/centros de
desenvolvimento e pesquisa e setor financeiro – ajustam perspectivas contendo
gastos e evitando riscos. Com isso, a redução das pesquisas e desenvolvimento
de produtos sofrem retração e o mercado de trabalho é penalizado. O resultado é
o que vivenciamos.
No tocante ao autônomo, não vinculado ao trabalho assalariado
formal e que depende de fatores oscilantes do mercado, a crise estendida tem
graves consequências. No meu caso particular, em que os insumos, suportes e substratos
utilizados, com preços fixados em dólar e custos variáveis, acrescidos de
impostos extras, advindos da crise fiscal e cambial, disparam o alarme. A primeira
medida é reduzir o ritmo de produção. A segunda é demitir metade de mim mesmo reduzindo,
a exemplo do que fez maduro na Venezuela, a atividade produtiva a quatro dias
da semana. Tal medida evoca o assoreamento do processo criativo. As consequências
disso podem ser bem definidas por um aforismo do Millôr Fernandes: “O desespero eu aguento. O que me apavora é a
esperança”.