A variedade de substancias tóxicas que
poluem a atmosfera não afetam apenas as condições climáticas do globo. Sua irradiação atravessa as camadas protetoras e
atingem diretamente as pessoas e as sociedades, deflagrando conflitos de múltiplas
conformidades. Miss Sarajevo já completou
maioridade,porém,mais da metade das suas colegas de concurso não tiveram a
mesma sorte. No meio do caminho foram curradas, vilipendiadas publicamente por
conta das suas etnias ou religião, quando não mortas e jogadas em
covas comuns.
Em 1991,
depois que a Croácia declarou sua independência e a minoria sérvia do país se
dobrou ao direcionamento assassino de Milosevic, as forças federais da Iugoslávia
invadiram a Croácia, dando início à guerra. Em
1998, foi a vez de Kosovo, província ao sul da Sérvia, lutar por sua
independência. O problema na região era mais delicado pelo fato de o território
de Kosovo ser considerado berço cultural e religioso para os sérvios. Nos três
meses de conflito o mundo assistiu a barbárie de uma ‘limpeza étnica’ contra os albaneses -
90% da população de Kosovo – em grande parte massacrada por Milosevic, então presidente da antiga
Iugoslávia. Cerca de 20 mil pessoas morreram no conflito e mais de 400 mil
ficaram desabrigadas.
As guerras pela independência naquela região ocultam intenções terríveis de fundo étnico e religioso. As fronteiras regionais são abismos profundos onde se lançam corpos e se oprime as culturas locais.
As guerras pela independência naquela região ocultam intenções terríveis de fundo étnico e religioso. As fronteiras regionais são abismos profundos onde se lançam corpos e se oprime as culturas locais.
A pergunta que
se coloca é: o que tem levado as guerras modernas pela independência a se
transformarem em caçadas étnicas e religiosas e punições coletivas aleatórias e
generalizadas?
Enquanto
Milosevic praticava abertamente seus crimes,no Cáucaso,mais precisamente na Chechênia, Djokhar Dudaiev, presidente nacionalista da República
da Chechênia, declarava a independência do seu país (1991). Em 1994 o presidente da
Rússia Boris Iéltsin enviou quarenta mil soldados para evitar a separação da
região da Chechênia - importante produtora de petróleo.Os insurgentes chechenos
infligiram grandes baixas aos russos. As tropas russas não tinham conseguido
capturar a capital chechena, Grózni, até o fim daquele ano. Os russos
finalmente tomaram Grózni, em fevereiro de 1995, após pesada luta. Em agosto de
1996 Iéltsin concordou com um cessar-fogo com os líderes chechenos, e um
tratado de paz foi formalmente assinado em maio de 1997.Mas,ao contrario do que se esperava um novo confronto armado foi retomado em setembro
de 1999, dando início à Segunda Guerra da Chechênia, tornando sem sentido o
acordo de 1997. Os separatistas chechenos ainda pretendiam a independência da
Chechênia e organizaram operações na própria república da Chechênia, como
também ataques terroristas em outras regiões da Rússia, incluindo Moscou.Uma
década de guerra deixou a maior parte do território sob controle militar. Guerrilheiros
islâmicos chechenos invadiram a vizinha república russa do Daguestão e
anunciaram a criação de um estado islâmico. A maioria da população, em ambas as
repúblicas, é muçulmana sunita. Os militares russos expulsaram os rebeldes para
a Chechênia em setembro, mês em que atentados contra diversos edifícios em
cidades russas mataram mais de 300 pessoas. O governo responsabilizou
diretamente os separatistas e enviou tropas à Chechênia.Apesar da pressão por
um cessar-fogo, o governo da Rússia rejeitou a mediação internacional. Mas as
denúncias de massacres, estupros e torturas cometidos pelas tropas russas
contra centenas de civis levaram o governo russo a aceitar, em março de 2000, a
visita de representantes da ONU à Chechênia. Mas as emboscadas e os ataques
suicidas contra as tropas russas prosseguiram, assim como os bombardeios aéreos
russos. Em junho de 2000, o presidente Vladimir Putin colocou a Chechênia sob
administração direta da Presidência da Federação.Em março de 2003, o governo
russo organizou um referendo na Chechênia, sobre a nova constituição local, que
estabelece subordinação da república a Moscou. A lei foi aprovada por 96% dos
eleitores, mas o referendo foi considerado irregular e condenado
internacionalmente. Num pleito igualmente criticado, em outubro de 2003, Akhmad
Kadyrov, foi eleito presidente da Chechênia, com 81% dos votos. Em setembro de 2004,
uma escola em Beslan foi palco de uma das
maiores barbáries da atualidade. Terroristas chechenos aprisionaram, torturaram
e mataram crianças, pais e professores. O líder separatista Shamil Bassaiev
assumiu a autoria desse e de outros ataques, como a explosão no metrô de
Moscou, em fevereiro do mesmo ano.Uma semana depois do atentatado de Boston que até agora matou seis
pessoas(uma criança,duas mulheres,dois policiais em serviço e um dos autores do
atentado além de ferir centenas de pessoas)levanta algumas questões: qual seriam
as intenções dos irmãos Tsarnaev
em estender os conflitos regionais para o território norte americano?
Muito se pode especular sobre esse ato. Primeiro é que ele tenha alguma ilação
religiosa punitiva contra os Estados Unidos, especificamente. E, segundo é que
se esse não foi um ato isolado,mas, um ataque programado por grupos terrorista,
uma espécie de jihad chechena que pretende abrir uma nova frente do terror para
além do âmbito regional.
O ultimo ataque terrorista dos grupos chechenos aconteceu em 2004 contra
crianças e professores em Beslam,Ossétia do Norte e o penúltimo de que se tem
noticia ocorreu no Teatro Dubrovka de Moscou, em 2002.
A diáspora chechena se espalha
por quase toda a Europa.
Existem milhares de
refugiados chechenos na Áustria, e outros milhares na Polônia, França, Turquia,
Cazaquistão, Dubai e em outros lugares (bem como as comunidades espalhadas nos
Estados Unidos). Alguns analistas dizem
que onde quer que estejam os chechenos se destacam
como uma nação à parte e que a maioria
do povo é constituída de "refugiados".
Talvez 20 por cento, talvez um pouco mais, de todos os chechenos não deixaram
Chechênia nos últimos 20 anos.
Dzhokhar A. Tsarnaev (19) o suspeito sobrevivente
dos atentados de Boston, nasceu em uma
família chechena. Ele era apenas um bebê quando Boris Yeltsin
enviou tanques para subjugar sua nação rebelde. Neste
ponto nós sabemos muito pouco sobre as motivações do suspeito. Tudo o que sabemos é que, para a sua
geração, a Chechênia tem sido sempre um lugar de violência, sequestros, viúvas,
órfãos e estupro: um lugar de onde fugir
e não mais voltar. Dzhokhar
Tsarnaev que foi capturado depois de um
confronto com a polícia em um subúrbio de Boston na sexta à noite e seu irmão,
Tamarlan, 26 anos, morto depois de uma perseguição policial na noite anterior tornam mais relevante
ainda a pergunta sobre o que levou esses irmãos a se inclinarem tão
destrutivamente na borda do
abismo? São muitas as motivações possíveis.
Uma das mais gritantes pode ser tirada da conclamação do líder militante Chechan Doku Umarov feita
em 2007: "Hoje no Afeganistão, Iraque,
Somália, Palestina, nossos irmãos estão lutando", disse ele. "Nosso inimigo não é apenas a Rússia, mas todos aqueles que estão em guerra contra o Islã."
Como se não bastasse
que a América tenha que se indispor com jovens como Adam Lanza, Dylan
Klebold e tantos outros assassinos em massa da história recente,surge no horizonte uma nova modalidade inescrutavel de ameaça. Nos EUA há armas
suficientes para matar qualquer um e, um louco, pode sempre encontrar um motivo qualquer para promover uma chacina.Se os irmãos Tsarnaev - jovens de origem chechena aparentemente adaptados na América – tiveram acesso a ideologia jihadista e, além disso, foram intoxicados pelas variantes da violência moderna, não é de todo improvavel que o que vimos em Boston foi
resultante de uma overdose de violência,disponibilidade
de meios e propósitos insanos que, quando
reunidos, geram morte e destruição em grande escala. Torço para que esses fatores letais não se encontrem
novamente.