sexta-feira, fevereiro 12, 2010

Exercicio de relativismo cultural


Adriano de Aquino
Jan-2010
Sob o manto das artes alguns personagens falam sobre suas idéias e obras insinuando que falam de uma verdade, um fenômeno singular, próprio ao individuo e a criação. Atestam que fora a sua verdade, a verdade não existe. Essa velha astúcia relativista, que serviu durante um período como fator desestruturante para antigos regimes ideológicos, tornou-se um princípio para a contemporaneidade. Pronunciamentos assim infestam os discursos artísticos. É impressionante ver artistas falarem de conceitos complexos sem nada saber sobre o que estão falando. Bem, por isso são artistas. Podem se apropriar “esteticamente” de discursos filosóficos e políticos sem saber nada sobre seu significado histórico social. Afinal, para alguns, a única verdade que sobrevém do caos é a verdade do artista. Ninguém ira lhe questionar. Ou melhor, ninguém vai perder tempo com isso!
A arte é meu campo de atividade por isso afasto para longe a falta de paciência e me proponho a levantar a poeira que se acumula sobre o acervo de bobagens que se instalou no ambiente artístico.
Na ultima palestra que participei tive a infelicidade de ouvir, de novo, a repetitiva, exaustiva e desinteressante versão particular da verdade. Foi longa e extenuante, se fosse mais curta seria apenas chata. Não reproduzirei aqui para não cansar o leitor. Também, seria desnecessário, é uma retórica bastante comum no meio artístico. Infelizmente, nesse dia fatídico meus neurônios não estavam propícios ao estado alfa. Ouvi, do principio ao fim. Num determinado ponto da dissertação, o tom blasée, típico dos indivíduos que se sentem enfastiados de comunicar a outros suas tramas mentais superiores, me irritou. Não foram as idéias, tenho certeza, era pura tolice, foi seu tom altivo, vaidoso e cheio de si.
Não resisti. Ao final da sua explanação o microfone voltou para a mesa e, não sei porque, pedi a palavra. Já havia falado antes, porém, a verborragia pedante do individuo funcionou como um interruptor nos meus miolos.
Disse eu:
-Sim, entendo! Segundo sua lógica, a verdade não existe. Certo?
-Sim, respondeu ele
-Bem, nesse caso, o que aconteceu com a mentira?
-Ahn!!!???
-Você nunca se colocou essa questão?
-Não!
-Então, seguindo seu raciocínio, se a verdade não existe logo a mentira também deixou de existir. Concorda?
-...!
-Seria incorreto pensar que, para você, a verdade e a mentira têm o mesmo valor?
-...!
-Nesse caso, se são iguais, nada me impede dizer, sem te ofender, é claro, que sua verdade é uma mentira.