Em 1929, o magistral filme "Un Chien
Andalou", Luis Buñuel registra uma sequência de imagens que penetrou fundo
no imaginário dos artistas da Vanguarda Histórica do início do século XX.
Tamanha potência se tornou um ícone, uma parábola
visual impactante, durante o longo percurso da modernidade.
A sequência de quatro frames do filme, foi
uma centelha que explodiu um paiol de sentimentos contidos,liberando milhares de especulações sobre Arte e Sociedade, transcendendo inclusive a
proposta estética do movimento Surrealista ao qual, na ocasião, Buñuel se
alinhava.
Esses momentos de rara inteligência e beleza se confrontam com a mesmice
da atualidade que, vez por outra
-frequentemente- por conta de uma cegueira coletiva me fazem
retroceder, retornando a um tema exaustivamente burro que insiste em guinchar,
rebocar e induzir artistas incautos e o público de arte a focarem nas obras de
arte ‘pautas’ das agendas da comunicação social.
Essa tolice vem de longe.
Teóricos e críticos de arte há muito imprimem
cacetadas de hipóteses que visam relacionar a criação artística aos campos da
psicologia, da sociologia, da etnia, da luta de classes e gêneros, engajamento
e,até, faixa etária – arte para a Infância/Adolescência e Senilidade- e outros
adornos que lotam as manchetes da realidade objetiva.
Entre o conjunto de subprodutos agregados ao fazer
artístico, a política tem pauta especial.
Em período de amplo relativismo Estético/Ético, a Política e Arte, formam uma dupla temática imbatível que se usa
para se encher o papel impresso com tolices.
Ontem, inaugurou mais uma feira de NEGÓCIOS focada
em produtos artísticos.
Pelo teor das notícias em torno do
evento, o que se constata é que nos dias de hoje em uma feira de arte, a
última coisa que se deve pensar é negócio.
Apesar de termos atravessado a
vanguarda e aberto espaço para manifestações estéticas radicais, o ambiente
cultural permanece impermeável e conservador, embebido em romantismo piegas que
coloca em segundo plano a ambição da categoria em fazer dinheiro.
O relativismo estético/cultural colocou
lado a lado o protagonismo artista/público - seja em uma feira de arte, em uma
visita a um museu ou a mostras contemporâneas temáticas, organizadas por
curadores.
Se há alguma transgressão nessas
órbitas, ela ocorre na vã tentativa de camuflar o objetivo do negócio de gerar
dinheiro e promover artistas, a fim de movimentar a máquina negocista em um
evento de arte.
Ao ler: “A feira de arte contemporânea
de São Paulo junta no mesmo espaço artistas e colecionadores, duas comunidades
que politicamente podem estar muito desencontradas. Com o seu público classe
média-alta, a SP-Arte pode não ter o público mais favorável a Lula da
Silva(...)Menos de uma semana depois da prisão de Lula da Silva, o
ex-Presidente do Brasil condenado a 12 anos de prisão por corrupção passiva e
lavagem de dinheiro, começa em São Paulo a feira internacional de arte
contemporânea (SP-Arte). Mas ao contrário do que se passou na última Bienal de
São Paulo, que coincidiu com a tomada de posse do Presidente Michel Temer
depois do impeachment de Dilma Rousseff, não se esperam
grandes protestos na feira de arte que dura até domingo no edifício do Parque
Ibirapuera, desenhado por Oscar Niemeyer(...)bem como a secção performance, que
abordavam temas ligados à escravatura e à descriminação racial, o que foi
possível ver em poucas horas no primeiro dia”.
Ora! Se uma feira de arte serve para
promover e colocar em debate as tendências artísticas em voga na
atualidade, os demais segmentos da cultura se tornam periféricos. Quer
dizer, tornam-se apenas repetidores do 'mainstream', focado nos fatos
cotidianos e de olho na grana.
Esse texto não é um manifesto, sequer
um protesto.
É apenas uma indagação: Se a
realidade não nos basta, a Arte, que nos abre
perspectivas existênciais mais amplas, impulsionada pelo frescor do
novo, se torna apenas um cosmético seco e inóspito, que
transforma beleza em feiura sob a premisa de refletir uma
'face' do Real? Uma feiura, mas, Real!
Então, recortes da realidade objetiva da
comunicação social se impõem, soberana.
Ela demanda e estimula a criação de cenários irreais, inundados de
autobiografias estetizadas, discursos e expressões individuais egóicas que manifestam
- na aparência de fugaz realismo – o objetivo de enaltece-lo , não
transcende-lo.
Miau!
Au!Au!
Miau!
Au!Au!