‘Dinheiro.
O único tabu que ainda resiste as ‘incertezas vivas’ que se espraiam mundo
afora no século XXI. Todo o resto foi superado nas lutas contra a opressão (sic).
A humanidade, enfim liberta (ibidem) dos tabus superficiais acumulados na longa
trajetória civilizatória, se curva diante do deus de todas as certezas. ’
Com essas palavras iniciei o diálogo com uma amiga.
Ela parecia triste e angustiada. Um dia antes enviou-me via whatsapp uma dezena de fotos de ‘obras’ que clicou na inauguração da feira de arte e eu sequer abri os arquivos. Quem, como eu, evita abrir mensagens carregadas, fóruns, debates, depoimentos e gravações com mais de 2’ nesse aplicativo, sabe perfeitamente as razões de não correr o risco. Na conversa telefônica, lamentei o fato e expliquei a razão, mas, não pude deixar de perguntar o porquê da angustia por um fato corriqueiro. Era tudo que ela queria para abrir sua arguição. Sem me perguntar o que achei das fotos das ‘obras’- um alivio- partiu direto para seu lamento, manifestando decepção por não ter visto na feira obras de alguns artistas que muito admira e que integram sua coleção particular.
Ela parecia triste e angustiada. Um dia antes enviou-me via whatsapp uma dezena de fotos de ‘obras’ que clicou na inauguração da feira de arte e eu sequer abri os arquivos. Quem, como eu, evita abrir mensagens carregadas, fóruns, debates, depoimentos e gravações com mais de 2’ nesse aplicativo, sabe perfeitamente as razões de não correr o risco. Na conversa telefônica, lamentei o fato e expliquei a razão, mas, não pude deixar de perguntar o porquê da angustia por um fato corriqueiro. Era tudo que ela queria para abrir sua arguição. Sem me perguntar o que achei das fotos das ‘obras’- um alivio- partiu direto para seu lamento, manifestando decepção por não ter visto na feira obras de alguns artistas que muito admira e que integram sua coleção particular.
Como
vocês não participaram da conversa, mas tem algum interesse em saber os detalhes,
é bom que eu ilustre o tema.
Não
tenho críticas quanto as iniciativas de mercado que visem ampliar o campo dos negócios.
Nesse ambiente, tudo, mas tudo mesmo, está sujeito às operações que visem gerar
receita, obter lucros e aprofundar a trajetória da mais valia. Nada escapa
dessa doutrina. Nem mesmo aqueles produtos artísticos que agregam gentileza sensível
ou aversão estetizada ao sistema ficam fora do foco do mercado. Dito isso, fica
esclarecido que para mim as feiras de arte são ferramentas de dinamização do
sistema financeiro e de fomento do comercio de arte. Aliás, as feiras sempre
foram uma forma direta de oferecer produtos ao consumidor. Nas feiras o
visitante tem um certo protagonismo ao escolher uns brócolis, um automóvel, uma
lancha ou uma obra de arte, leva-los para casa e se sentir gratificado. Portanto,
problematizar uma mostra de produtos estéticos com essa característica é uma
premissa ingênua. As feiras de arte, bem montadas e geridas por profissionais
competentes é uma excelente oportunidade de negócio.
Pronto!
Já estamos na conversa.
Porém,
a glamourização das feiras de arte e as mostras paralelas que as escoltam,
criaram um ruído que repercutiu em muita confusão. Tanto entre frequentadores
ansiosos por novidades como entre artistas desejosos de visibilidade. Uma inauguração
cheia de gente alegre, rica e bonita, circulando entre obras de arte é muito
estimulante. Esse diferencial distingue uma feira de arte de uma feira
dominical de artesões numa praça qualquer da cidade. Nesse ponto, se criou um falso
problema. O fato de entusiasmar os visitantes e ser um evento com grande
visibilidade midiática, difundido na agenda cultural da cidade, não significa a
mesma coisa que ser um evento especifico de arte, onde se expõe propostas estéticas
mais arrojadas e experimentalismos performáticos que, por suas particularidades
não caberiam -aliás, esteticamente não deveriam caber- no escopo dos negócios
de uma feira de arte.
Ufa!
Mas, não para aí. Se é para problematizar vou adiante. Avançarei sobre a
trincheira do tempo e trarei para o presente um episódio que mudou o curso dos
eventos culturais, especificamente focados na arte.
Em
1863, quando a vanguarda fervilhava em Paris, os artistas problematizaram o
salão oficial da Real Academia Francesa de Pintura e Escultura. Os artistas,
recusados pela crítica dominante da época, recorreram ao Imperador Napoleão III
a fim de suprir tamanha injustiça. Napoleão os atendeu, mandando que se fizesse
uma mostra paralela, que foi intitulada Salon des Refusés.
A
proposta foi recebida ironicamente pelos conservadores. Eles acreditavam obras
de arte recusadas no salão oficial, atrairiam um grande público disposto a
ridicularizar as obras dos recusados. Entre eles, Manet e Cézanne. Apesar da reação desfavorável
aos trabalhos expostos, o Salon
des Refusés passou a ser um
forte concorrente do salão da academia. A partir daquele ano, a iniciativa
agregou muitos artistas que, mais adiante, organizaram exposições independentes
como a dos Impressionistas, em 1874.Assim, o Salão dos Recusados foi,
em síntese, o embrião para a consagração social da pintura moderna.
Para finalizar, a crítica
que não faço ao empreendimento das feiras de arte, é destinada a um evento que
deveria ser de cunho especificamente artístico, como a Bienal de São Paulo, mas,
por absoluta desconexão com a pluralidade estética dos dias atuais, aquele
evento se tornou um circo temático regido pelos humores dos curadores.
Os curadores dos salões
oficiais da Real Academia
Francesa de Pintura e Escultura, foram
esquecidos. Apenas os pesquisadores sabem quem foram. Napoleão III, está
registrado na história de França como um imperador controverso que, por sua
compreensão, permitiu o desabrochar de uma nova estética.
Não há
nenhuma ‘incerteza’ quanto a isso.
Contudo, “Incerteza viva / Live Uncertainty”, que no meu entender deveria ser contestada veementemente pelos artistas e pelo público que refutam o método seletivo e arcaico de uma mostra de arte contemporânea,passa despercebida. Os 'Refusés' constrangidos se refugiam nas Certezas Oprimidas/ Certainties Oppressed (versão global) para ali se debulharem pelo fato banal e corriqueiro de não estarem numa barraca da feira de arte. Essa é a problematização recalcada que o tabu(poder)do dinheiro oculta da clientela.