sábado, maio 25, 2013

Um matrimonio feliz




A visão do cérebro como uma espécie de área social ( ou de serviço)onde atuam  forças politicamente rivais parece, a principio, uma  fantasia divertida. Algo que caberia perfeitamente num roteiro de filme de ficção cientifica. Ocorre que alguns filósofos e cientistas estão levando a complexa rede neural muito a sério e se aprofundando em pesquisas que poderão suscitar uma nova compreensão sobre o que se passa e como se relacionam o provedor(cérebro) e o software (mente).Por milhares de anos se questionou sobre as funções do cérebro ou sobre o que é realmente  a mente e, mais ainda,quais as funções da mente? Entre esses três elementos sobrevém,inevitavelmente, um enigma: qual a relação existente entre cérebro e mente?
Sobre esse labirinto de hipóteses, o site Edge  postou no Tópico:MIND. em [1.8.13] http://www.edge.org/conversation/the-normal-well-tempered-mind  uma conversa com Daniel C. Dennett 
Daniel Clement Dennett é um proeminente filósofo norte americano. Suas pesquisas se prendem principalmente à filosofia da mente (relacionada à ciência cognitiva) e a biologia. Dennett é também  um dos mais proeminentes ateus ou,que diabos isso signifique.Pode-se imaginar que se trata de  algo similar a um Papa do ateísmo da atualidade. Para Dennett, os estados interiores de consciência não existem. Em outras palavras, aquilo que ele chama de "teatro cartesiano", isto é, um local no cérebro onde se processaria a consciência, não existe, pois, admitir isto seria concordar com uma noção de intencionalidade intrínseca. Para ele a consciência não se dá em uma área especifica do cérebro, como já dito, mas em uma sequência de inputs e outputs que formam uma cadeia por onde a informação se move. Essa ideia é desenvolvida em  A Ideia Perigosa de Darwin,um dos livros de Dennett .
Com o titulo "The normal well -Tempered mind"(Normal mente bem humorado,em tradução literal)cabe muito bem na interpretação pessoal que fiz da conversa do Dennett
No meu entender, suas investigações penetram numa preciosa região da mente e podem desvendar um novo conhecimento de nós,seres pensantes.
Uma das virtudes do conhecimento é elucidar questões cruciais que atravancam a vida e dificultam o acesso à felicidade. O bom humor é,para mim, um elemento fundamental desse jogo.É ele que promove e sustenta de forma consistente a  reversão da insatisfação pessoal diante dos reveses impostos pela realidade objetiva.Hoje,o bom humor,  é  um valor capital,muito  mais importante que a fortuna, a glória e outras vetustas  representações sociais e o qual vale a pena se dedicar com afinco.Nessa conversa Dennett abre algumas portas no corredor do conhecimento. Suas palavras podem auxiliar e fortalecer nossa determinação em não gastar um tempo precioso com tolices e disputas estúpidas.
Após desfazer um erro cometido há alguns anos, Dennett avisa ao leitor que  reiniciou um novo percurso nos labirintos da mente. Adotando um desvio do mito ou “Alegoria” da caverna, uma via clássica da história da Filosofia,onde  Platão discute sobre teoria do conhecimento, linguagem e educação na formação do Estado ideal. Dennett, todavia, prefere a via do desmonte da mente em mentes mais simples e, em seguida, em mentes mais simples ainda, até encontrar a mente que pode ser substituída por uma máquina. Esse procedimento,chamado de funcionalismo homuncular,tem inicio na pessoa. A partir dela inicia-se uma sucessão de quebras em duas, três, quatro ou sete sub pessoas que são basicamente agentes. Esses homúnculos encetam um retrocesso que é apenas um regresso finito, o qual se deve tomar cada um deles e dividi-los em um grupo de homúnculos especializados. Seguindo esse procedimento chega-se a partes que podem ser substituídas, como numa máquina.
Para Dennett, essa é uma ótima maneira de pensar sobre a ciência cognitiva. É o bom e velho AI(Inteligência Artificial) da qual  Dennett é um conhecido  estudioso . Mas, sua critica sobre o procedimento adotado anteriormente, o levou a rever aspectos da ideia, basicamente certa quando foi concebida, mas que  um grande erro quase o direcionou para um câmara  sem saída. Nas suas palavras: “Eu estava naquele momento encantado com o neurônio lógico McCulloch-Pitts. McCulloch e Pitts tinham reunido a ideia de um neurônio artificial muito simples, um neurônio computacional que tinha várias entradas e uma única saída.Suas pesquisas  provaram que, em princípio, uma rede neural feita desses neurônios lógicos pode calcular qualquer coisa que você queira calcular. Isso foi muito emocionante para mim,pois, significava que, basicamente, você pode tratar o cérebro como um computador e tratar o neurônio como uma espécie de elemento básico de comutação. Isso foi, certamente, uma simplificação excessiva. Todo mundo sabia que  era uma simplificação excessiva, mas as pessoas não percebem o quanto, e, mais recentemente, tornou-se claro para mim que é uma dramática simplificação excessiva, porque cada neurônio, longe de ser um switch lógico simples, é um agente com uma agenda e  são muito mais autônomos  e muito mais interessantes do que qualquer switch.” Ele continua sua explanação preliminar dizendo que:” A pergunta é: o que acontece com as suas ideias sobre a arquitetura computacional quando você pensa em neurônios individuais não como escravos obedientes ou como máquinas simples, mas como agentes que têm de ser mantidos na linha e que tem que ser devidamente recompensados a ponto de formarem  coalizões e cabalas, organizações e alianças? Esta visão do cérebro como uma espécie de área social de forças politicamente rivais parece uma espécie de fantasia divertida, mas, agora está se tornando algo que eu levo muito  a sério e é alimentado por uma série de diferentes correntes."
Bem, se sua mente não foi banhada pelo tédio e você chegou até aqui tentarei expor uma parte simples do conceito de Dennett que alegrou meu cérebro, ou mente? 
Ele comenta uma passagem fascinante do trabalho do biólogo evolucionista David Haig sobre os conflitos intrapessoais. Haig coloca algumas questões ao nível da genética e até mesmo ao nível do conflito entre os genes que você recebe de sua mãe e os genes que você recebe do seu pai, os chamados genes madumnal e padumnal. Desse amálgama surge um vetor iridescente que estimula uma nova visão sobre a mente humana. Segundo Haig; se os genes madumnal e padumnal ficam fora de sintonia, graves desequilíbrios podem acontecer. Esses desequilíbrios aparecem na pessoa como determinadas anomalias psicológicas. A partir daí surgiu a compreensão de que o cérebro não é um sistema bem organizado comandado  por um painel de controle hierárquico, onde tudo está em ordem.Numa visão um tanto  dramática,para mim  claustrofóbica, da mente como um escaninho entupido de docs. externos,padrões de procedimento, normas de conduta social,aspiração e desejo e onde se processa a burocracia 'existencial' a partir da compreensão de que somos o que pensamos e que,em sintese, um núcleo separador de escolhas  boas e más. Na verdade, a mente é  mais parecida  com a  anarquia, com  laivos de democracia. Às vezes você pode alcançar a estabilidade através da ajuda mútua entre genes e atingir uma espécie de calma, então, tudo é ótimo. Mas, a possibilidade de que  coisas 'fora do lugar' ou mesmo uma aliança ‘madrasta’ ganhe o controle, acontecimento  bastante comum,sua mente te coloca no inferno. Se isso ocorrer, em algumas pessoas ocorre com muita frequência, o indivíduo começa a ter obsessões, delírios, compulsões inexplicáveis e assim por diante. Por outro lado,  uma mente bem-humorada possui uma organização suave que  orienta o individuo pelo bom caminho. Essa é uma conquista, algo que só é alcançado quando tudo está bem, mesmo quando, no âmbito geral, a humanidade e a maioria das pessoas estão tirando as calças pela cabeça. Em parte isso explica também que mesmo diante da zorra global, grande parte das pessoas vive relativamente bem em ajuntamentos conflitosos e  gigantescos.
Finalizo essa nota com uma observação interessante nas palavras do próprio Dennett:  “O que estamos vendo agora na ciência cognitiva é algo que eu tento  antecipar há  anos, e, agora, está acontecendo. Está acontecendo tão rápido que é difícil manter-se atento aos seus desdobramentos.Estamos afogando em dados e, também, estamos felizes. Jovens brilhantes que cresceram em meio a esse turbilhão  e para quem isso é  apenas uma segunda natureza, estão imersos em pensar em termos computacionais bastante abstratos.Coisa que tempos atrás era simplesmente impossível, mesmo para  especialistas.Agora uma criança motivada adequadamente pode chegar a faculdade já preparado para  adentrar essas questões. É muito emocionante.Eles estão indo rápido,quase  fugindo de nós.Vai ser divertido assistir.A visão do cérebro como um computador está mudando velozmente. O cérebro é um computador,porém,muito  diferente de qualquer computador que você está acostumado.Não é como seu desktop ou laptop, não é como o seu iPhone, exceto em alguns aspectos.É um fenômeno muito mais interessante. O que Turing nos deu, pela primeira vez (sem Turing você simplesmente não podia fazer nada disso)foi  uma maneira de pensar de forma disciplinada sobre os fenômenos que têm, como eu gosto de dizer, trilhões de partes parecidas que nos leva a especular o que  aconteceria caso deixássemos  as ovelhas ou os porcos  recuperarem seus talentos selvagens.”
A conversa é enorme e cheia de texturas fantásticas.
Quem quiser ir adiante aciona o link no corpo desse texto.


domingo, maio 12, 2013

OBJETO LACUNA

Tom Friedman's pizza sculpture.
Photo:Fred R. Conrad/The New York Times

Adriano de Aquino
05/2013

Hoje é um risco (!) falar sobre arte sem focar preços, visibilidade midiática, indicadores de status cultural, marketing e... espetáculo.Mas,se porventura, a cabeça falante ousar criticar o sistema que tudo disciplina,porém,aparentando tudo tolerar, é bem provável que receba os mais arrebatados xingamentos . Afinal, resistir pra que?Aliás, resistir também pode ser taxado pela galera dos contentes de reacionarismo, recalque e outros adjetivos mais ofensivos ainda.
Que assim seja!
Ainda que a gradual supressão da crítica ou de uma fala sensível, quer dizer, fora dos padrões palatáveis aos meios de comunicação, à margem dos códigos dominantes ou das igrejinhas mais 'influentes' no jogo da ocasião seja um fato incontestável,poucos ousam falar sobre isso. Nos dias atuais a vertente do pensamento crítico se tornou um sub item sofisticado para a fruição de poucos interessados e uma prática anacrônica dispensável para o bom funcionamento do sistema de arte. O que ela poderia acrescentar para a reflexão sobre o fenômeno artístico vem sendo operado satisfatoriamente pelas súmulas curatoriais e pela mídia cultural.
Para mim, como artista, esse fato assenta uma série de questões. A primeira delas revela um amálgama nocivo que essa tendência tenta ocultar atrás de resultados financeiros estonteantes e na fixação, no ambiente artístico,do culto ao deleite fugaz. Uma simulação ‘pop Cult’ procura induzir no público a ideia de que existe hoje, como jamais ocorreu na historia, um consumo(interação) imediato de produtos estéticos de ponta . O alicerce desse milagre não é a arte em si, em contato direto com o público, mas, o sucesso das fórmulas institucionais e mercadológicas que viabilizaram maior acesso do público a arte.
Penso que muitas pessoas estão mobilizadas pelo glamour dessas instâncias intermediarias situadas entre a arte e a sociedade,seja pela colossal oferta de produtos estéticos,seja pelo lastro de dinheiro e patrocínios administrados por instituições culturais que,diga-se de passagem, mais parecem parques temáticos da arte contemporânea. Essa magnânima oferta pode, a principio, ser entendida por muitos como uma ação afinada com o pluralismo cultural e em prol da diversidade estética.Será isso mesmo?
Se por um lado o imediatismo das ações do mercado associado às estratégias institucionais promove um fluxo maior de dinheiro no sistema, por outro, abre uma lacuna que estigmatiza o objeto sensível reduzindo o campo de avaliação das suas qualidades intrínsecas e o tonando suscetível, antes de tudo, ao alvitre dos agentes de intermediação, colocando em segundo plano a apreciação estética autônoma e despachando para o quinto dos infernos os valores da arte em detrimento do preço e do status cultural a ele anexado. Isso explica, em parte, o apogeu alcançado pela cultura do espetáculo na contemporaneidade.
Mas, a que custo?
Em contraposição aos acontecimentos de aparente liberdade criativa que hoje despontam por todo lado, observo uma armadilha. O aclamado abandono da imitação naturalista, a proliferação de estilos,a inefável decadência dos salões oficiais -bienais & etc. hoje em disputa frontal pela frequência do público com as feiras de arte e similares- o louvor ao discurso 'outsider' visando o exito das teorias de ação tática sobre os espaços consagrados, na esteira dos ‘não’ dos autênticos, expressados pelos artistas da vanguarda histórica em prol da liberdade criativa e contra o adestramento estético oficial,se tornaram,de poucos anos para cá,ecos de um passado longínquo sem nenhuma ressonância efetivamente transformadora na cultura da atualidade.Lamentavelmente,resultaram na formação de novos paradigmas que fundamentam atitudes e procedimentos similares aos das escolas de arte do passado só que numa velocidade mais acelerada. Como se pode notar a questão central não acontece no plano artístico,quer dizer,nos domínios das propostas estéticas substanciais ou mesmo inovadoras em confronto com correntes estabelecidas e consagradas.Sequer sugere ou aponta alternativas inusitadas de apresentar um trabalho artístico ou ofertar ao público novas modalidades de fruição da arte, mas,sim, consolidar ainda mais os velhos métodos de projeção social de estilos, visibilidade, comunicação direcionada e inserção mercantil dos produtos estéticos.
Afinal,o vale tudo é,em si, uma afirmação: se libertar de que, se tudo é permitido? Aliás, mais permitido ainda se sua voz encontra eco na mídia e comentários enaltecedores endossam sua celebração. Se tiver, então, resposta imediata na conta bancária é uma glória.
Não pensem que acho uma corrupção ou um desvio de conduta um artista viver bem do seu trabalho. Ao contrario! Penso que o artista deve prezar sua atuação tanto no que tange a liberdade criativa quanto no plano profissional/financeiro. A pergunta que coloco é uma variante desse fator e coloca em questão o seguinte: produzir sua obra, alheio às circunstancias das operações institucionais e de mercado é uma modo consciente de estar no mundo?
Deixo a resposta para cada um dos leitores!
Minha ideia inicial não era expor tantos pontos de vista, mas sim tocar num ponto especifico de uma matéria publicada hoje na coluna Art Review do jornal NYT. Mas,sabe como é,uma coisa leva a outra.Todavia,prometo que sobre o que se segue não postarei juízo de valor.
No inicio da matéria: “40 Nations, 1,000 Artists and One Island “ Roberta Smith alerta o leitor dizendo: “Algumas pessoas odeiam feiras de arte e a maioria das pessoas acaba por odiá-las por algum tempo. É moda ser sarcástico e condescendente com eles, mas isso é muito fácil. Feiras de arte, agora e no futuro próximo, representam esforços coletivos - senão as esperanças e sonhos - de milhares de pessoas que querem a arte como centro de suas vidas.”
Absorvi essa abertura com certa ironia mas, sem sarcasmo, e segui lendo o texto deglutindo discordâncias,porém,evitando deixar crescer uma resistência intransponível que me impedisse de seguir adiante na matéria até seu final.
Lá pelo meio da segunda página a Roberta foi fundo ao situar essa vontade da arte como centro existencial de uma vida, ao criar mais uma categoria de apreciação estética adaptável para pessoas de uma certa idade. Sem sarcasmo algum penetrei nesse labirinto conjectural:
“ No final do percurso algumas dicas merecem uma atenção especial : O estande da L & M Arts de Barbara Kruger se "você olhar bem," apresenta uma prestigiosa escolha de obras de arte para pessoas de uma certa idade.” Mais adiante,fechando a matéria Roberta alude tambem ao gênero nas artes,criando uma outra perspectiva de inserção para além da questão propriamente artística: “ Não quero deixar de mencionar com justeza os esforços dos artistas do sexo feminino que parecem particularmente fortes.”