sexta-feira, junho 18, 2010

Alegrem-se com o Novo, envergonhem-se do Velho!


Alegrem-se com o Novo, envergonhem-se do Velho!
B.Brecht
Adriano de Aquino
06/2010
Guardo, sempre a vista, desde a adolescência, essa ultima frase do poema de Brecht intitulado A Procura do Velho e do Novo.Usada aqui como titulo é arrepiante.Pode ser entendida como provocação irritante,uma afirmação desprezível ao que um dia foi,como tudo mais,alegre,estimulante e que o tempo encarregou de tornar velho e nostálgico. À medida que diferenciamos os ângulos de observação essa curta frase se estende,amassa,enruga e volta a se esticar, recompondo-se e reintegrando-se as mais intimas questões ou ardendo em confrontos com os valores e ícones impostos pelos novos tempos. Afinal, fala de um destino irremediável do qual todo ser humano, arte, cultura e modelos civilizatórios estão tragicamente condenados. É bom frisar que minhas reflexões surgem e se desenvolvem à partir de associações livres.Não sou um expert em Brecht,muito menos um scholar. Não é minha pretensão revelar um conhecimento que não possuo sobre o processo criativo,envolvimento ideológico, objetivos políticos e estética revolucionaria do famoso poeta e dramaturgo. São reflexões desprovidas de intuitos históricos e desvinculadas de posições politicamente corretas,tão em voga em nossos dias. São apenas impressões que coletei nas minhas próprias experiências.Esclarecido isso, me ponho a apresentar os motivos que levaram essa frase a ser protegida e sobreviver em um micro clima mental durante tanto tempo. Por que ela sobreviveu,se renovou em diversos momentos de minha vida?Por que ela e não outras citações e idéias, mais amenas e aparentemente mais férteis?
Não sei se todos conhecem o poema na integra.Vou colar no final desse artigo.Se colar agora,nesse momento, os leitores irão se lixar para minhas elucubrações,pois, poesia tão poderosa tende a tornar banal e dispensável qualquer esforço em decifrá-la.
Pelos idos das décadas de 60/70quando resolvi acatar minha escolha pela vida artística, o mundo tinha uma configuração bastante diferente da que hoje vivenciamos. Achei, num texto que escrevi em 2008,um maço de anotações
[Quando lerem seus papéis
Pesquisando, dispostos ao assombro
Procurem o Velho e o Novo, pois nosso tempo
E o tempo de nossos filhos
É o tempo das lutas do Novo com o Velho] -valeu Brecht! que situa minha visão de mundo na época. Escrevi:... Para um jovem daquele período, que dava os primeiros passos no mundo da arte, um expressivo conjunto de valores da modernidade ainda permeava a mentalidade da época colocando em questão a idéia ocidental de Absoluto e focando o caráter efêmero da vida e da arte. As sucessivas marteladas de Nietzsche, que ainda ecoam como uma forma de desencantamento do mundo, a argúcia arrasadora de Freud contra as ilusões metafísico-religiosas e os fundamentos sócio-econômicos de Marx, dissolveu no ar o que ainda restava de oculto nas crenças e nos negócios do mundo moderno. As colunas centrais da religião, das instituições acadêmicas e as velhas hierarquias econômico/social, alvos de contestações de toda ordem, balançavam. As ruas tornaram-se palco da insatisfação. Movimentos de jovens transbordaram das universidades, escolas , museus, galerias, bibliotecas e espraiavam pelos campos e avenidas.Um enorme processo de desconstrução, que teve inicio na alta modernidade, encontrou nos jovens do século XX, sobretudo nos da geração dos anos 60/70, a voz e a potência para o confronto com toda autoridade constituída: Estado, família, arte, instituições, gênero,sexualidade, política, propriedade, ideologia, mercado, tradições, mente, corpo etc. No meu entender essa foi a derradeira agitação estético/cultural que, mobilizando e transformando inúmeros modos de expressão artística, curiosamente, não era em si, um movimento específico das artes. Não podemos esquecer que os grandes concertos de música, as polêmicas exposições de arte, a literatura, as leituras de poesia, etc. que empolgavam uma multidão de jovens ocidentais, não eram, ainda, fenômenos atrelados à indústria cultural ou submetidos a interesses econômicos mais objetivos. Essa geração se propunha reconstruir,ou melhor,revolucionar o mundo.Senão,ao menos, adentrarem uma vida melhor sobre as ruínas do passado. Havia uma alegria contagiante pelo Novo e certa vergonha pelo Velho!
Ainda bem que o ruído estridente das guitarras,os gemidos dos sexos emancipados, as viagem psicodélicas etc. não me impediram, por muito tempo, de ver que esse troço de arte jovem era uma arapuca,uma bobagem.
A grande arte é cúmplice do tempo!
As revoluções políticas que se consolidavam também não deixaram margem a duvidas sobre o caráter perverso do poder dominante de coloração extremada, que se estabilizou sobre os anseios de mudança e liberdade.
Quando as utopias amainaram vimos que a paisagem havia se alterado substancialmente. As ideologias políticas perderam muito do seu poder sedutor, regimes autoritários entraram em colapso, e arcaicas estruturas institucionais desmoronaram por completo.
Olha o novo aí de novo,gente!
Uma nova cultura econômica, aparentemente mais flexível, que acenava com a perspectiva de prosperidade para os povos surgiu no horizonte. Pouco importa o nome que se dê ao conjunto de forças políticas e econômicas que se empenharam nessa nova via. O fato é que a abundância de recursos trazidos por essas mudanças expandiu o mercado em todas as direções. Simultaneamente, uma embrionária rede tecnológica se expandiu e de forma magnífica transformou de um extremo a outro o panorama cultural. A dinâmica dos recursos oferecidos pela tecnologia da informação produziu um forte impacto em todo sistema produtivo. Na arte esse impacto é enorme. As modalidades de produção, as reações e a mentalidade que hoje se fixou no ambiente cultural dá margem a inúmeras considerações.
Parte da produção artística da atualidade, voltada para a produção de ícones, gestos, instalações, gadgets etc. e fundadas sobre a égide da efemeridade da vida e da arte acionou a partida de um NOVO discurso estético. Os produtos artísticos hoje em voga se apropriam de itens de um sub-repertório. Eventos inspirados em logos banais e cotidianos subiram ao status de arte. Parecem ao primeiro olhar, manifestações integradas ao complexo sistema de comunicação hoje disponível e um desdobramento conseqüente do impacto produzido pelos novos meios tecnológicos. Porém, se olharmos com mais atenção é possível vislumbrar um certo desconforto. Uma reação curiosa tenta ilustrar as virtudes de um novo mundo que conecta indivíduos de todo o planeta. O modelo de arte mundialista que nos últimos trinta anos enche as grandes mostras de arte internacionais parece afirmar que o desejo de ruptura das fronteiras geográficas, tão desejada pelos modernistas, tornou-se realidade,uma realidade restrita a grupos específicos. Artistas de diversas regiões do globo, oriundos de culturas há pouco tratadas como periféricas pelos grandes centros, aparecem, de repente, integrados ao Pantheon artístico universal. Para o otimista boquiaberto isso é uma constatação cabal de que as instituições se reinventaram e o ajustamento de suas políticas distribui saber e harmonia entre as diversas culturas do planeta.
Oh! Mundo maravilhoso!
Nunca na historia um movimento estético de ponta foi tão rapidamente assimilado,enriquecendo marchands,agentes e artistas da noite para o dia.
Porém,no subterrâneo, as coisas são bem diferentes. Muito mais do que se imagina. O surgimento das inúmeras ferramentas tecnológicas trouxe um grande problema para a arte. Incapazes de produzir, por meios tradicionais, estímulos aptos a fazer frente às trocas culturais disponibilizadas por novos recursos tecnológicos, uma parte da produção estética aderiu à demanda de uma nova fase promocional e mercantil, outra se fechou num circuito restrito de eleitos protegidos por curadores a serviço de instituições publicas e privadas. Contudo, as duas vertentes se submeteram a ideia de que uma aparente democratização das linguagens artísticas- uma espécie de vale tudo- é um recurso admissível. Contudo, essas iniciativas não responderam, muito menos ultrapassaram, os expedientes repetitivos de anunciar a morte dos meios tradicionais de expressão: a morte da pintura, da escultura do desenho etc. Tolice,sabemos que nada morre apenas por decreto.
Os artistas que desejam permanecer pintando,fazendo seus objetos sem se dar conta das transformações que ocorrem no tecido social,artistico e cultural tendem a se sentir excluídos da dinâmica do seu tempo . 
A recusa de refletir sobre as transformações que ocorrem ao seu lado é confortável,porem,não potencializa suas ambições a uma esfera mais ampla que seu atelie.    
Por outro lado,caso o envelhecimento e a morte das formas tradicionais de expressão artística fosse uma verdade, os modelos estéticos da atualidade teriam fatalmente que enfrentar a mesma sentença, seriam coagidos frente à dinâmica do presente. No entanto, essa duvida não é sequer cogitada.Bem,uma lógica que despreza o fato de que a arte quando poderosa,subverte preconceitos,modelos e sistemas,não consegue ir além do seu território de interesses.
Alheios a isso, os arautos de um modo de produção estética consolidado nos anos oitenta continuam repetindo a mesma bobagem. Talvez,porque essa é a forma mais fácil que encontraram para manter visibilidade na mídia e no mercado. Isso nos leva a supor que de 30 anos para cá a arte e o meio social atingiram perfeita harmonia.Se compararmos o modelo estético hoje dominante com as correntes estéticas do modernismo constatamos o quanto a contemporaneidade é repetitiva e entediante.
Isso fica escandaloso quando sabemos que nenhum movimento artístico do modernismo ultrapassou 10 anos de predominância de modelo.
É uma piada compararmos a mobilidade estética do modernismo com a     longevidade dos modelos da atualidade. 
As instalações,por exemplo,sua permanência como modelo estético  é um mistério de proporções faraônicas.Hoje,todo mundo é instalador,se não é agora,será um dia.Isso explica,em parte,o meu tédio nas visitas as megas exposições de arte. A longa permanência de um padrão estético levanta a suspeita de que a arte supostamente mundialista alcançou seu objetivo qual seja; recalcar o aparecimento de sucessivas experiências artísticas.
O Novo versus o Novo é o engodo da contemporaneidade.
Explico: no sentido inverso dos artistas da vanguarda histórica que contestavam toda forma de conservadorismo, regulamentos oficiais e regimes estéticos, um grande numero de artistas contemporâneos parecem satisfeitos com o padrão dominante e a regras institucionais seletivas.Em minhas considerações sobre a arte mais difundida nas ultimas três décadas não excluo a possibilidade de sujeição da atividade criativa à crescente centralidade da economia na vida contemporânea. Ao contrário de seus precursores, um grande contingente de artistas pós–modernos enxerga na institucionalização precoce uma virtude. Suas estratégias se montam a partir desse juízo. Os vários modos artísticos que surgiram no pós Segunda Grande Guerra herdaram e souberam usar a diversidade difundida pelos artistas da vanguarda histórica. Esses movimentos contestavam o sistema oficial de arte e a institucionalização pomposa. Os prodigiosos movimentos estéticos dos anos 50/60 são ricos, não apenas pelas obras que legaram e as questões que suscitaram, mas, também, pela abertura artística e cultural que disseminavam. Arrisco dizer que tal circunstancia permitiu aos artistas desse período inaugurar um fluxo produtivo fundado na autonomia criativa, ratificando, criticamente, alguns valores do modernismo e renovando a relação da arte com o imaginário da imortalidade. Esse último item é importante para entendermos melhor as repetitivas argumentações dos artistas atuais sobre a efemeridade como um enunciado estético que delineia as propostas da arte contemporânea. Ainda que o efêmero, anunciado como fundamento teórico da arte atual, pareça inédito ele não é. De fato, esse enunciado é um simulacro do imaginário da imortalidade diferenciado por artifícios conceituais.
Alguns segmentos das artes plásticas conceberam uma versão própria do relativismo nietzschiano mesclado a teorias dispersas coletadas em vertentes do pensamento desconstrucionista. A ligação com a vida acadêmica levou alguns artistas a adicionarem aditivos de antropologia cultural para acentuar o sabor de conhecimento pleno e funcionar como agente para rápida diluição de todo e qualquer critério artístico identificado,então, como reação conservadora. Munidos de fragmentos dispersos e convencidos da luta por uma causa nobre, artistas e teóricos partiram contra os focos de reflexão crítica e aptidão técnica, habilidades que vem sendo gradativamente desprezadas. Instalou-se, então, a crença de que vivemos hoje numa sociedade de homens livres e que todo individuo está apto a produzir o que bem entende sem mais se submeter a nenhum critério externo a si. Tal conceito se tornou um senso comum no campo artístico. Esse tipo de relativismo tornou-se o bálsamo para todos os males preenchendo de estratagemas a vaga idéia de que todo e qualquer procedimento estético tem o mesmo valor simbólico - a única coisa que os diferencia é a fama de quem os faz e o preço. Para consolidar sua permanência no meio cultural os adeptos dessa vertente falam da realidade como um fenômeno imutável e afirmam que a flexibilização dos meios de produção tornou possível a expansão da liberdade. Essas manifestações justificam nossa preocupação.É sempre bom lembrar que a confusão intelectual que se instalou é notável,porém, impotente contra a inevitável renovação crítica.
É até certo ponto compreensível, em uma sociedade altamente competitiva, a coexistência de grupos fechados. O recrudescimento das religiões, o consumismo galopante e outras formas de transferência imposta pelo cotidiano são dados que sempre levamos em conta quando refletirmos sobre a vida atual. A fragilidade das teorias dominantes que visam impor a idéia de que tudo que é avançado em arte é pleno de significado elevado e tem como objetivo a intervenção crítica imune às convenções, esbarra no fato de que o reconhecimento e a confirmação de suas investidas estão em conformidade com os pactos formais de que tudo que é identificado como avançado, inclusive o capitalismo avançado, espelham nossa época, a qual devemos nos curvar,cultuar e não contestar. Contestar a manipulação que sustenta o sucesso é hoje entendido como ataque histérico dos invejosos.Poucas vezes deparei com tão grande asneira. Uma asneira que se consolida e prolifera.Tem sempre um funcionário da imprensa para incensar o discurso de um ícone do mercado.As materias sobre cultura se concentram nas citações sobre preços e nas opiniões vaidosas sobre as preferências mercadológicas de um artista.Um diz que evita os leilões,insinuando uma diferença com aqueles que alcançam altos preços nesse sistema.Fica por aí!Sobre processo criativo,pensamento ou estética-O silencio! No fundo isso revela que importante mesmo é o negócio. O negocio da arte!
Warhol,considerado um visionario da cultura pop, adorava cunhar frases de efeito.Sua frase:"A arte suprema é o negócio" explodiu na cabeça de seus cultuadores como uma causa. Um contingente de artistas saiu repetindo esse aforismo sem mesmo se dar conta do que representava.Afinal, nem todos tem o talento de Warhol.Em suas performances sociais diárias,atras das lentes de seus óculos com olhar de caçador de raposa, Warhol sussurrava para legião de seguidores que o prestígio do artista recluso era Velho, Novo era o brilho das celebridades, Um Novo onde o negocio da arte é uma ferramenta imprescindível.
Um negócio que, de um tempo para cá, ganhou mais visibilidade que a própria arte.
Alegrem-se com o Novo! Envergonhem-se com o Novo de novo.Ele é Velho!
A poesia:
Procura do Velho e do Novo
Bertold Brecht
Quando lerem seus papéis
Pesquisando, dispostos ao assombro
Procurem o Velho e o Novo, pois nosso tempo
E o tempo de nossos filhos
É o tempo das lutas do Novo com o Velho.
A astúcia da velha trabalhadora
Que toma ao professor seu saber
Como um fardo pesado demais, é nova
E deve ser mostrada como Novo.E velho
É o medo dos trabalhadores,durante a guerra
De aceitar os panfletos que tem o saber, deve
Ser mostrado como Velho.Mas
Como diz o povo: na mudança de lua
A lua nova segura a lua velha
Uma noite inteira nos braços.A hesitação dos receosos
Anuncia o novo tempo. Sempre
Determinem o Já e o Ainda!
As lutas de classes
As lutas entre o Velho e o Novo
Ocorrem também dentro de cada um.
A disposição de ensinar do professor:
O irmão não vê, o estranho vê.
Examinem todas as ações e emoções de seus personagens
Na busca de Velho e de Novo!
As esperanças da mercadora Coragem
São fatais para seus filhos: mas o desespero
Dos mudos com a guerra
Pertence ao Novo. Seus movimentos desamparados
Ao arrastar o tambor salvador para o telhado
A grande ajuda, devem enchê-los
De orgulho ,a energia
Da mercadora que não aprende, de compaixão
Pesquisando , dispostos ao assombro
Alegrem-se com o Novo, envergonhem
-se do Velho!

terça-feira, junho 15, 2010

Ciberespaço?Onde fica?Pra que serve?

Há algum tempo me sugeriram que falasse sobre o que leva tantas pessoas, eu inclusive, a manter contínuo contato através das redes sociais. Como entusiasta dessa onda achei que seria útil colocar algumas considerações sobre essa coisa chamada relacionamento virtual. Topei a idéia. Ocorre que escrever sobre um fazer que já se tornou quase um hábito é complicado.Além do mais , uma série de compromissos, datas e trabalho intenso mantinham meus pensamentos longe desse assunto.Fui adiando o intento enquanto pude.Afinal,sentar diante do micro e passear pelas paginas do Facebook,saber das pessoas,ler textos e poesias e trocar mensagens é um prazer,porém,falar sobre as coisas que fazemos e porque fazemos dá um trabalho danado e exige dedicação.Não basta um tempo livre.São tantas idéias que vagam distantes.Junta-las num bloco de notas demanda uma cabeça afim de encarar a missão.Abri as gavetas da mente e digitei algumas coisas. Depois de inúmeras divisões e subdivisões essa primeira parte ganhou uma forma que acredito ser legível.

Espero que tirem proveito.

Adriano De Aquino

06-2010

Ao contrario daqueles que atribuem à comunicação virtual um papel secundário que, por alguma razão “nobre”, digamos assim, os mantêm alheios ou fazem piadas sobre os que se dedicam intensamente as trocas virtuais, penso que a atividade virtual colocou no plano concreto alguns fatores de considerável relevância.Não apenas o mundo da comunicação institucional/empresarial-jornal, revistas, propaganda e marketing - sofreram e vêm sofrendo abalos em suas estruturas formais e de negócios. O mundo, depois do advento e profusão das novas tecnologias da informação e comunicação, não é mais o mesmo.

Isso é fato!

Mas, como aferir essas mudanças?Ou, como comprovar que a vida social mudou, para melhor ou pior?O homem emancipou-se de velhos hábitos, costumes e preconceitos? E os meios de produção, se alteraram substancialmente?Essas são questões importantes, todavia, por tangenciarem aspectos objetivos exigem indicadores técnicos apurados. Esse não é um campo de forte interesse em minhas reflexões. Isso não quer dizer que eu não leia ou me interesse por argumentos, estudos e livros que aprofundem esses itens. A Sociedade em Rede de Manoel Castell e a Cultura da Convergência de Henry Jenkins, para citar apenas dois trabalhos do gênero, supriram minha curiosidade sobre as aplicações da TI na sociedade contemporânea e suas conseqüências na cultura e na vida social. Seria inútil, pelo menos nessas reflexões, tentar argumentar por esse viés. Não conseguiria transferir para o leitor dados que pudessem contribuir para a compreensão do conjunto de indicadores que esses autores e outros mais fornecem de maneira clara. No entanto, no âmbito da observação e experiência pessoal, posso oferecer algumas notas sobre esse assunto

Recentemente, num encontro de amigos, esse tema veio à tona. Na ocasião ouvi uma serie de considerações contrarias a importância das redes sociais e coloquei algumas idéias sobre a substituição gradual dos meios de comunicação e sua influencia no transito de códigos sociais.

Observei que, em geral, as criticas a virtualidade se concentram em fatores econômicos (marketing pessoal vulgar, abusos contra o direito autoral, publicidade invasiva, etc.), na superficialidade da comunicação virtual e na atuação dos órgãos de inteligência que vasculham e monitoram as paginas da internet. Não duvido que esses fatores existam e que mereçam atenção e cuidado, contudo, uma das características da cultura é não submeter todos, de maneira hegemônica, aos insidiosos desejos de um poder predominante, seja econômico, político ou comportamental. Além do mais, definir como superficial as múltiplas possibilidades oferecidas pela rede de comunicação global é, em si, um diagnostico superficial. Todos sabem que a eficácia da cultura reside em sua dinâmica de constante mutação e, nesse sentido, sempre haverá desconfiança, dissidência, subversão e confronto com os valores impostos através da duvida sobre as intenções de uma noticia aparentemente “séria” veiculada num jornal, livro ou documento, ou por um post colado numa pagina de um site de relacionamento.

Na oportunidade propus que deixássemos de lado os aspectos econômicos, a espionagem e os riscos de invasão de privacidade que hoje afligem muita gente e olhássemos a internet como um sítio aonde a troca de experiências pessoais vem angariando dia a dia, maior valor. Alguns experts afirmam que os sites e outras ferramentas virtuais não tem se mostrado, no correr desses anos, eficientes maquinas de fazer dinheiro. Porém, sua rápida expansão vem gerando grandes prejuízos aos veículos de imprensa e as mídias convencionais. Talvez, por essas razões, a internet seja encarada por alguns como economicamente inconveniente.

Afinal, o compromisso com a noticia e a verdade dos fatos é mais conveniente quando gera recursos e sustenta um poder. Entretanto, o poder da grande imprensa, como todo poder, está sujeito a crises.

A crise da imprensa que hoje testemunhamos tem contornos graves.

É freqüente, em situações intricadas, se correr atrás de um responsável pelo prejuízo.

Já ouvi e li muitas explanações. A mais usual aponta a internet como a principal responsável pela crise da grande imprensa.

Será?

Não creio, melhor dizendo, não gostaria que a expansão da internet se concretizasse sobre a sepultura dos grandes jornais e revistas. Todavia, caso a internet seja de fato a principal responsável pelo prejuízo é bom que as grandes organizações da imprensa acelerem na direção correta, pois, tudo indica que a internet não diminuirá velocidade, ao contrario. Se a grande imprensa pretende permanecer tão poderosa quanto foi no passado recente, necessita urgentemente de um acelerador ligeiro e certeiro.

Assisti, dias atrás, uma publicidade da Folha de São Paulo veiculada na TV. Uma imagem bacana de um canto da cidade (São Paulo, certamente) é pano de fundo para a atriz Fernanda Torres anunciar as mudanças do jornal. Fernanda nos informa que a Folha mudou, sugerindo ao telespectador que o jornal adotou um novo estilo. A propaganda acertou na escolha da atriz para desempenhar uma mensagem informal. Figura e fundo se mesclam caprichosamente, despertando, de passagem, certa semelhança com muitos vídeos postados no Youtube.

Num ataque de São Tomé, visitei a pagina da Folha on line e constatei que mesmo não sendo uma propaganda enganosa, não deixa de ser uma mensagem equivocada.

É licito que a Folha anuncie. Afinal, ela precisa de novos leitores e, se possível, recuperar os que perdeu para a internet.Contudo,o êxito de tal desafio passa por questões mais complexas sobre as quais uma propaganda tem pouco poder de sedução.

Um leitor não compra apenas um jornal, compra uma quantidade de matéria jornalística bem tratada,credibilidade e uma boa leitura.

Se a propaganda que vi se comprovasse no acesso livre aos cadernos, as crônicas e outras matérias eu constataria, no ato, alguma mudança. Porém,assim como muitos jornais brasileiros, o acesso on line da Folha permanece restrito aos assinantes. A melhor propaganda de um jornal é seu produto e esse produto é feito por jornalistas e outros profissionais de imprensa que já constam da folha de pagamento da empresa. Por que pagar uma agencia de publicidade para anunciar um produto que só pode ser avaliado e credenciado através da leitura?

Essa pergunta torna-se mais evidente quando constatamos que qualquer navegante pode acessar livre e gratuitamente todas as matérias jornalísticas de muitos dos grandes jornais do mundo.

No meu ponto de vista o acesso livre às matérias jornalísticas não é o principal motivo que leva o leitor a abandonar a leitura dos jornais. Quando me pergunto sobre as causas que me levaram gradualmente a abandonar a leitura diária dos periódicos, quer dizer, do jornal impresso, e tento relacionar esse fato ao meu cotidiano na internet, a suspeita de sua responsabilidade na crise da grande imprensa torna-se um álibi frágil.

Motivações mais danosas para o gradual afastamento do publico podem ser investigadas em outros cantos. Por que não no equivoco das estratégias da grande imprensa para conviver e sobreviver às mudanças radicais dos últimos trinta anos?

Nesse período, pessoas com mais de 50 anos viram seu campo de trabalho virar de pernas pro ar. Indivíduos mais reticentes e mesmo os mais flexíveis foram empurrados para um novo tempo. Sujeitos de faixa etária produtiva foram compulsoriamente aposentados. Isso não ocorreu apenas no trabalho regular ou no emprego fixo de setores mais graduados da população. O fato é que uma multidão de pessoas foi excluída de uma participação econômica e social mais ampla. Gostemos ou não isso é um fato. Nas artes, na política, nos negócios e nas relações interpessoais ocorreram mudanças substanciais.

Essas reflexões advêm de uma duvida- como disse acima; se inúmeros experts afirmam que a internet não é uma fonte de lucros para todo e qualquer negócio, sobretudo para aqueles do campo da comunicação, por que seria para um jornal?

Os núcleos comerciais das empresas jornalísticas parecem desconhecer esse fato. Será que não sabem que se alguém tem interesse numa matéria especifica publicada por um jornal de acesso restrito, algum amigo de sua rede de relacionamento, assinante do diário, poderá lhe enviar a matéria inteira por email ou pelas ferramentas disponíveis nos sites de relacionamento? Simples assim!

Muitas pessoas parecem não entender e resistem em vão a uma nova realidade.

O fato é que a internet não atrai as pessoas porque usurpa os direitos das “commodities jornalísticas” (o slogan é de Murdoch que agora integra o mundo virtual por vontade própria. Acusou o Google de surrupiar direitos e comprou o site de relacionamento MYSPACE que até 2006 reunia 106 milhões de usuários registrados. Se o Myspace fosse um país teria a 11ª população do mundo - entre o México e o Japão).

O poder da internet reside no fato de que conecta milhões de pessoas interessadas em trocar experiências e divulgar suas produções, coisa que as empresas de comunicação não têm condições de oferecer.Quando ocorre, é fruto de interesses por vezes difusos.

Não é apenas a tecnologia rápida de comunicação, ferramentas, joguinhos, noticias atualizadas segundo a segundo que conferem valor crescente e, até certo ponto, incontrolável à internet. O livre trânsito e a franquia de espaços como as redes sociais, onde pessoas se expressam livremente, postam imagens, vídeos, textos, teorias, poemas e tudo mais que transita no dia a dia, vem credenciando a internet como um vetor de comunicação plural e democrático. É muito difícil, pra não dizer impossível, que as grandes empresas de comunicação consigam superar essas ofertas.

A adoção de um marco legal é uma medida positiva, creio que sua aprovação evitara o predomínio do vale tudo e dos abusos que circulam na rede,prevenindo grandes prejuízos às empresas e indivíduos .O governo brasileiro vem conduzindo de forma correta sua elaboração. Entretanto, qualquer tentativa, por parte do Estado,dos empresários e organizações privadas de comunicação de conter a expansão da internet através de medidas extremas, reverterá em conseqüências dramáticas para a liberdade de expressão.

Muitos navegantes manifestam a opinião que os anseios do homem ultrapassam as questões econômicas e que a informação é um bem comum que não deve estar sujeito apenas às diretrizes empresariais, ao gosto e ditames das editorias. Essas pessoas encontraram na internet um lugar para trocas produtivas.

É por essa e outras razões que milhões de pessoas buscam as redes sociais

Entendo que a multidão de experiências em transito possa parecer confusa e inócua para aqueles que se abrigam na duvida diante do novo e tendem a reduzir as trocas virtuais a questões factuais: O que fazemos aqui?Onde isso nos levará? O que tudo que dizemos e ansiamos pode ser realizado concretamente?

No sentido mais amplo essa pergunta não é nova. Precede a existência da internet. Foi feita repetida vezes por persas, gregos, romanos e toda a sorte de gente da antiguidade, do oriente milenar ao ocidente moderno.

A filosofia, no correr de sua existência expandiu o horizonte do saber, as religiões continuam garantindo a segurança celestial para aqueles que aceitam e obedecem a seus mandamentos e a ciência, um vetor do conhecimento supostamente mais equipado para responder essa questão ou uma parte dela, coloca, à medida que desvenda alguns mistérios, outros, mais complicados ainda.

Porém, nós, indivíduos, como nos posicionamos diante do que vem ocorrendo no mundo?

Aceitamos os postulados religiosos e vamos em frente, filiamo-nos a uma corrente do pensamento filosófico, nos abrigamos nas ideologias, nos entregamos de corpo e alma aos pareceres científicos?

O fato é que na vida cotidiana esses fatores são boa parte do tempo relevados, esquecidos. Enfiamos-nos em relações amorosas, em negócios e carreiras que nos transferem uma carga pesada de compromissos e obrigações.

Então, nos confrontamos com a missão de cumprir uma existência amorosa, realizar um trabalho que nos recompense, se possível enriqueça. Enfim, sair do anonimato, ser reconhecido e alcançar a felicidade. Dito assim parece simples, mas, sabemos, é um desafio que até Hercules temeria enfrentar. Ocorre, entretanto, que nessa missão estamos sozinhos. Afora os livros de auto-ajuda, nenhum texto sério, tratado científico ou teologia religiosa secular se aventuraria a responder a todos de uma só forma. As escrituras sagradas, as pesquisas científicas ou os textos filosóficos foram e são gerados na tentativa de responder as grandes questões do homem e da natureza, num patamar elevado onde a fé ou o método, nem sempre infalíveis, tornam-se opacos, diante das necessidades pessoais do dia a dia.

Bem! Então, o que fazemos aqui, no ciberespaço?

Entendo que um grande número de pessoas, cansadas dos modelos verticais de intermediação social e comunicação, busca um lugar onde possam trocar livremente pensamentos, experiências pessoais e produção. Hoje, com a internet, ninguém mais espera que um crítico generoso ou um jornalista sensível note e divulgue o quão importante é a obra de um poeta desconhecido ou de um artista extraordinário, sem visibilidade na mídia, ações, instalações, gestos e outros meios disponibilizados no atacado ou varejo da arte. Atualmente, o poeta navegante, seus amigos e fãs se ocupam de divulgar o que consideram admirável. Centenas de pessoas o lêem, comentam e apreciam. Esse é o maior valor que circula na internet. Trocando em miúdos; nesse local, o que você pensa, posta e comenta tem VALOR. Nada e ninguém têm poder para interromper, desviar ou adulterar esse fluxo. Nesse NOVO canto do mundo os diretores de seção e os editores de pauta até uma “nova ordem”, foram aposentados.